28/03/2018
por [Advogado] Otávio Mei de Pinho Bellarde"...a referida lei estabelece o rito a ser seguido pelo fiduciário para viabilizar a alienação forçada do imóvel dado em garantia, conferindo ao fiduciante, inclusive, uma última oportunidade de purgar a mora antes da derradeira consolidação da propriedade em favor do credor."
A alienação fiduciária de bens imóveis é instituto regulado pela Lei nº 9.514/97 e consiste em negócio jurídico pelo qual o devedor (fiduciante) transfere ao credor (fiduciário) a propriedade resolúvel de um bem de seu patrimônio, visando garantir outro negócio jurídico. Muito embora o primeiro permaneça com a posse direta do bem, a propriedade só será retomada após o pagamento integral da dívida.
Como se percebe, trata-se de pacto acessório, destinado apenas a garantir a satisfação do crédito oriundo da obrigação principal. Ocorrendo o adimplemento integral da obrigação pecuniária pelo devedor fiduciante, o credor automaticamente deve entregar o bem dado em garantia. Por outro lado, no caso de inadimplência, deve o fiduciário alienar o imóvel em hasta pública e aplicar o preço da venda no pagamento de seu crédito e das despesas e encargos respectivos, e, se houver, entregar ao devedor a importância que sobejar.
Essa modalidade de garantia tornou-se muito comum e vantajosa ao vendedor/incorporador ou agente financeiro, uma vez que, verificado o inadimplemento do fiduciante, o procedimento de extinção do contrato e excussão da garantia é realizado integral e diretamente no Cartório de Registro de Imóveis, sem a necessidade da tutela do Poder Judiciário.
Nesse ponto, a referida lei estabelece o rito a ser seguido pelo fiduciário para viabilizar a alienação forçada do imóvel dado em garantia, conferindo ao fiduciante, inclusive, uma última oportunidade de purgar a mora antes da derradeira consolidação da propriedade em favor do credor.
Não obstante o rigorismo da lei, a sua rotineira aplicação prática gerou profundas discussões, principalmente a respeito das particularidades da intimação do fiduciante para purgação da mora e da necessidade ou não de sua intimação pessoal da designação das datas dos leilões do imóvel, aspectos de suma importância para resguardar a legalidade do procedimento e aperfeiçoamento da alienação fiduciária.
Adotando a premissa de que o devedor deve ser efetivamente cientificado da realização de um ato de tamanhas consequências – expropriação de imóvel de seu patrimônio particular –, a jurisprudência inclinava-se a declarar a nulidade de leilões concretizados sem a intimação pessoal do fiduciante para purgação da mora ou quando impedido de comparecer por não ter sido notificado da data, horário e local das hastas.
Com o objetivo de solucionar as divergências, em 08 de setembro de 2017 entrou em vigor a Lei nº 13.465/17, que alterou diversos dispositivos da Lei nº 9.514/67 e, entre eles, tratou especificamente das mencionadas controvérsias, pacificando de forma definitiva a matéria.
A inovação legislativa, conquanto tenha corretamente mantido a indispensabilidade da intimação pessoal do fiduciante para purgação da mora, consagrou a possibilidade do oficial do Registro de Imóveis, suspeitando da ocultação maliciosa do devedor, “intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, retornará ao imóvel, a fim de efetuar a intimação, na hora que designar” (artigo 26, § 3º-A).
Evitou-se, enfim, os questionamentos acerca da lisura da intimação efetivada em pessoa diversa do devedor, quando nítido o seu intuito de se furtar ao ato e impedir a continuidade do procedimento expropriatório.
Ademais, a necessidade de cientificação pessoal do fiduciante acerca da designação das hastas públicas também foi mantida, mas flexibilizada pela inserção do artigo 27, § 2º-A, que permite a comunicação das datas, horários e locais “ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico”.
Assim, o legislador entendeu suficiente o direcionamento da carta ou telegrama ao endereço declinado pelo próprio devedor no contrato, sem a necessidade do recebimento em mãos próprias, evitando-se uma incansável busca pelo seu paradeiro caso pretenda esquivar-se da notificação para obstar a perda do imóvel.
As questões envolvendo a alienação fiduciária de imóveis são permeadas de minúcias e exigem uma interpretação cuidadosa para preservar não apenas a correta aplicação dos dispositivos legais correlatos, mas também dos princípios consagrados na Constituição Federal. A alteração legislativa promovida pela Lei nº 13.465/17, que completou seis meses de vigência, foi implementada em boa hora e maximizou a efetividade do procedimento extrajudicial da alienação fiduciária em prol do credor frustrado pelo não recebimento de seu crédito.