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A fiança locatícia prestada em razão da condição de sócio da empresa

30/09/2014

por [Advogado] Fernando Corrêa da Silva Filho

"A exoneração da fiança nos contratos com prazo determinado não é permitida, mas em tal hipótese, em que o sócio retira-se da sociedade pela quebra do ‘affectio societatis’, a jurisprudência é pacífica pela concessão da exoneração."

É praxe nas sociedades a prestação de fiança por um dos sócios como garantia dos contratos de locação firmados pela empresa na qualidade de locatária. O sócio, entretanto, deve ficar atento quando de sua retirada do quadro social, pois o simples fato de desligar-se da empresa não significa exoneração automática da garantia fidejussória.

Por ser a fiança contrato benéfico com ‘intuitu personae’, desaparecendo a ‘affectio societatis’, a confiança em torno da qual gira a prestação da garantia também desaparece, o que permite ao sócio-fiador exonerar-se mediante notificação extrajudicial ou ação judicial exoneratória.

Para saber qual medida deve ser tomada (judicial ou extrajudicial), primeiro deve-se analisar o contrato de locação. Caso a fiança tenha sido prestada por prazo indeterminado, o fiador pode exonerar-se mediante simples notificação extrajudicial, nos termos do artigo 835 do Código Civil. Caso a fiança tenha sido prestada por prazo determinado, o fiador deve ingressar com ação de exoneração.

Nesse sentido, se o contrato de locação estiver dentro do prazo de vigência, o sócio-fiador deve propor a competente demanda judicial declaratória exoneratória, baseando-se na quebra da ‘affectio societatis’ e do intuito persona como interesse de agir. Caso o prazo tenha sido estipulado ou prorrogado por período indeterminado, ainda que a fiança tenha sido prestada “até a entrega efetiva das chaves”, pode o sócio-fiador exonerar-se da garantia mediante simples notificação extrajudicial, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança durante 60 (sessenta) dias contados da notificação do locador.

A exoneração da fiança nos contratos com prazo determinado não é permitida, mas em tal hipótese, em que o sócio retira-se da sociedade pela quebra do ‘affectio societatis’, a jurisprudência é pacífica pela concessão da exoneração.
Sobre a possibilidade de exoneração nos contratos por prazo determinado e ainda em vigência, o egrégio Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no seguinte sentido:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. LOCAÇÃO. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. RETIRADA DE SÓCIA DA PESSOA JURÍDICA. EXONERAÇÃO DA FIANÇA. INTUITU PERSONAE.

1. É cabível a exoneração da garantia fidejussória prestada à sociedade após a retirada da sócia-fiadora, em face da quebra da ‘affectio societatis’.
2. Tendo a sócia fiadora e seu cônjuge notificado o locador de sua pretensão de exoneração do pacto fidejussório, em razão da sua retirada da sociedade que afiançaram, direito lhes assiste de se serem exonerados da obrigação, uma vez que o contrato fidejussório é ‘intuitu personae’, sendo irrelevante, no caso, que o contrato locatício tenha sido estipulado por prazo determinado e ainda esteja em vigor.
3. Em se cuidando de contrato de natureza complexa em que a fiança pactuada o é enquanto preservado o contrato societário, faz-se evidente que a resolução de qualquer dos contratos implica a resolução do remanescente, mormente se a essência complexa do contrato foi aceita pelo locador, na exata medida em que locou o imóvel à pessoa jurídica, sendo fiadora uma de suas sócias.
4. Recurso provido." (REsp 285.821⁄SP, 6.ª Turma, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ de 05⁄05⁄2003; sem grifos no original.) 

Cumpre esclarecer que a sentença declaratória da exoneração da fiança produz efeitos desde a citação da ré para a lide, conforme já decidido pelo egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo no julgamento da apelação n.º 9263426-68.2008.8.26.0000. Isso quer dizer que o ex-sócio-fiador somente responderá pelas dívidas anteriores à data da citação, que consiste na cientificação da ré pelo Poder Judiciário do conteúdo da ação judicial contra si.

Assim sendo, aqueles que exercem a função de sócio-fiador de suas empresas, em caso de desligamento do quadro social, devem ficar atentos às formalidades exigidas pelo Código Civil e pela jurisprudência, sob pena de permanecer garantidores de obrigações contratuais das quais não possuem mais gerência ou conhecimento, lembrando que a fiança locatícia é uma das causas de afastamento da impenhorabilidade do bem de família, ou seja, o imóvel em que resida o fiador não é protegido de penhoras para pagamento da dívida locatícia.