30/01/2018
por [Advogado] Fernando Corrêa da Silva Filho"A ideia principal é garantir ao cidadão informações mínimas e relevantes para tomar decisões econômicas segundo seus interesses próprios."
A legislação brasileira exige que todas as sociedades anônimas de capital aberto divulguem ato ou fato relevante que possa influir de modo ponderável na cotação dos valores mobiliários de emissão da companhia; na decisão dos investidores de comprar, vender ou manter aqueles valores mobiliários; na decisão dos investidores em exercer quaisquer direitos inerentes à condição de titular de valores mobiliários emitidos pela companhia.
Tal exigência garante o princípio central da regulação e da fiscalização dos emissores de valores mobiliários, denominado “full and fair disclosure”, norteador da lei das sociedades anônimas (Lei n.º 6.404/76) e da lei do mercado de capitais (Lei n.º 6.385/76).
O “full and fair disclosure” teve origem no direito estadunidense e coloca o Poder Público na posição de responsável pela exigência de um nível mínimo de informações a serem prestadas pelas companhias que pretendam captar a poupança popular.
A ideia principal é garantir ao cidadão informações mínimas e relevantes para tomar decisões econômicas segundo seus interesses próprios.
A Instrução CVM n.º 358 exemplifica vinte e um atos ou fatos potencialmente relevantes no parágrafo único de seu artigo 2º, porém, como dito, o rol é exemplificativo e não taxativo, de modo a permitir o surgimento de outras informações necessárias ao conhecimento geral diante da subjetividade do conceito de fato relevante.
É justamente nessa subjetividade que se deve prestar atenção, pois deixar de divulgar fato relevante acarreta a responsabilização dos administradores e/ou do Diretor de Relação com Investidores por violação a um dos deveres de fidúcia (dever de informar) previsto no artigo 157, §4º, da Lei n.º 6.404/76 e no artigo 3º da ICVM n.º 358.
A transgressão a essa disposição, nos termos do artigo 18 da ICVM n.º 358, configura infração grave para os fins previstos no §3º do artigo 11 da Lei n.º 6.385/76, que permite a aplicação direta, portanto sem necessidade de reincidência, pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, de:
(i) “inabilitação temporária, até o máximo de 20 (vinte) anos, para o exercício de cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários”;
(ii) “suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades de que trata esta Lei”;
(iii) “inabilitação temporária, até o máximo de 20 (vinte) anos, para o exercício das atividades de que trata esta Lei”;
(iv) “proibição temporária, até o máximo de vinte anos, de praticar determinadas atividades ou operações, para os integrantes do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários”;
(v) proibição temporária, até o máximo de dez anos, de atuar, direta ou indiretamente, em uma ou mais modalidades de operação no mercado de valores mobiliários.
Além dessas penalidades, a Comissão de Valores Mobiliários – CVM pode impor aos infratores, isoladas ou cumulativamente:
(i) “advertência”;
(ii) “multa”;
(iii) “suspensão do exercício do cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários”.
A multa, que antes não podia exceder o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), passou a ter o teto de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) com a alteração dada pela Lei n.º 13.506/17, recentemente publicada no Diário Oficial da União, em 14 de novembro de 2017, conhecida como “Lei de Leniência do Banco Central e da CVM”.
O agravamento das penalidades dá mostras da preocupação regulatória com o atendimento ao princípio do “disclosure”, tudo para garantir a segurança do mercado. Por outro lado, o subjetivismo do ato ou fato relevante deixa os responsáveis pela divulgação em franca vulnerabilidade.
A única exceção à imediata divulgação está prevista no artigo 6º da ICVM n.º 358, que assim dispõe:
“Art. 6º. Ressalvado o disposto no parágrafo único, os atos ou fatos relevantes podem, excepcionalmente, deixar de ser divulgados se os acionistas controladores ou os administradores entenderem que sua relação porá em risco interesse legítimo da companhia”.
Essa exceção, todavia, cai por terra caso a informação fuja do controle ou na hipótese de ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados, nos termos de seu parágrafo único, abaixo transcrito:
“Parágrafo único. As pessoas mencionadas no caput ficam obrigadas a, diretamente ou através do Diretor de Relações com Investidores, divulgar imediatamente o ato ou fato relevante, na hipótese da informação escapar ao controle ou se ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados”.
O atendimento ao princípio do “disclosure”, portanto, é extremamente importante para a segurança do mercado de capitais e, com o recente agravamento das penalidades, deve ser objeto de redobrada atenção por parte dos responsáveis legais pela divulgação, que, para se preservarem, não devem economizar no atendimento ao dever fiduciário de informar.